SEMINÁRIOS
Acesso à Lida de Fi-MeninaResumo
Local: Sede do CFRJ (Leblon)
Situação: Quatro seções, sobre o Alcoolismo, publicadas no livro O Porre e o Porre do Quincas Berro Dágua, Aoutra Editora, RJ, 1985. A primeira e a última (décima-quinta) seções, publicadas no maisum - Boletim do CFRJ, n° 8 (20 nov. 81) e n° 1 (20 maio 81) respectivamente. A sétima e a oitava seções, publicadas nos fascículos do CFRJ, LUGARejus, n° 9 (set. 80) e n° 7 (jul. 80) respectivamente. Textos das demais seções em preparação.
Resumo
Na primeira de suas quinze seções - Super-Homem, A Mulher -, o tema do Seminário, a Sexualidade Feminina, é colocado como uma questão difícil de ser situada. Já que a psicanálise não pode se referir a comportamentos sexuais para destacar estruturas discursivas e subjetivas, como apresentar o que seja o campo do feminino? E mesmo o que se chama de Homem, como espécie, também não encontra definição satisfatória no nível do enunciado. A psicanálise apenas verifica que aqueles que se dizem desta espécie são falantes, estão na afetação dessa fala, estando assim no "privilégio" do simbólico, e que é só mediante ele que a diferença sexual se estatui.
Toma-se o texto A Significação do Falo, de Lacan, para expor que, no caso do falante, o Falo é o que determina a diferença entre masculino e feminino. Ele não é um órgão, mas um significante, portanto, segundo a lógica construída pela psicanálise, é determinante dos efeitos de significado. Por outro lado, é também o significante do que é o próprio núcleo do falante: o desejo. Este se diferencia completamente da necessidade (animal), pois o ser falante se acha desviado em relação a ela devido à sua dependência do Outro, que é sua sujeição ao significante. O falante é, portanto, sujeito ao desejo.
Tratando das questões trazidas pelo Estádio do Espelho, de Lacan, toma-se em consideração o que acontece na relação especular encontrada na Etologia animal: embora haja aí diferença, há um mapeamento ponto a ponto que permite um acoplamento entre macho e fêmea. No caso do falante, em função de sua falta constitutiva, não há como determinar seu objeto sexual, isto é, seu outro-sexo do sexo-próprio (noções apresentadas no Seminário do ano anterior, O Pato Lógico). Assim, o que há é uma sexualidade completamente desregrada: há um furo nessa região, o qual está presente onde quer que o falante compareça. Isto faz com que haja um deslizamento perene de sua sexualidade, nenhuma normalidade podendo ser invocada para seu comportamento: existe diferenciação sexual, existe diferença em jogo, mas não marca distintiva. No lugar do furo, então, do ponto de vista estrutural, coloca-se um espelho, com sua lógica. Qualquer coisa que ali se espelhar pode estar no lugar do outro-sexo, seja qual for sua configuração corporal. O ser falante, por sofrer de uma falta originária, vive, portanto, em excesso, em ex-sexo, que é o que se chama de amor.
Nas três seções seguintes - Os Rouxinóis & as Flores; Pra não Dizer que só Falei de Flores; e Menina da Rua -, inicia-se o tratamento mais específico das fórmulas quânticas da sexuação, de Lacan; das questões envolvidas nas lutas partidárias dos machismos e feminismos; e do Gozo-Fálico, que é o que põe como marca de seu limite a referência ao S1. Se o Falo é o significante que, no campo do Outro, situa o que diz respeito ao desejo, a relação de cada sujeito para com o Falo é mediada pelo S1, que é o significante que o marca no seu processo identificatório. Mas o que se verifica é que o Gozo-Fálico, que tem provas de sua existência (no orgasmo, p.ex.), não se basta. Do ponto de vista da espécie homem, machos e fêmeas gozam falicamente, mas, apesar disto, há milênios, insiste-se na existência de um outro gozo, específico do que se chama mulher, o qual, entretanto, não se apresenta. Lacan diz que A Mulher não existe, mas existem mulheres, que são seres que freqüentam esse gozo. Isto independentemente da anatomia. Então, mulher é um ser que, além de homem, é outra coisa, mas não se sabe o quê. Segundo a psicanálise, é no nível do significante que o feminino pode comparecer.
Nas quinta e sexta seções, Papai Dossel e Tarzan do Mau Caco, retoma-se um ponto fundamental de questionamento ao longo dos Seminários: a Interdição do Incesto. A partir do que o texto Estruturas Elementares do Parentesco, de Lévi-Strauss, apresenta sobre o avunculado como estrutura elementar, questiona-se a universalidade tanto da Interdição do Incesto quanto da estrutura do Édipo, de Freud. Mediante os conceitos de Nome do Pai, metáfora paterna, Pai Ideal, o binômio lei/desejo, o Outro, conclui-se que a única existência estrutural tanto da Interdição do Incesto quanto do Édipo é a de deslocar Narciso de sua imagem. Ao contrário de Lévi-Strauss, o autor coloca que a estrutura do avunculado é universal em qualquer grupo humano. Para além do nível antropológico, ela é uma decorrência de toda e qualquer fundação de Sujeito no enunciado. Um dos objetivos desse questionamento é tratar das relações do discurso pedagógico com o discurso psicanalítico, o que desemboca, no Seminário de 1992, na colocação da psicanálise como Pedagogia Freudiana. Outro objetivo é lançar a questão (retomada no Seminário de 1995, sobretudo na seção A Extradição do Incesto): não é possível uma sociedade sem relações de parentesco?
A sétima seção, Aos Cães e aos Porcos, é uma intervenção pontual a propósito da repercussão, na mídia, de um Congresso da IPA realizado no Rio de Janeiro. Denuncia-se a covardia de ditos analistas que se escoram em saberes de outros campos para, na TV e no jornal, "esclarecer o público" quanto à existência de "psicopatas e perversos" que, segundo eles, se passavam por analistas sem terem formação médica. Enfatiza-se, então, a diferença da psicanálise para com a medicina, a terapia, a psicoterapia ou qualquer seita iniciatória.
Na oitava seção, Améfrica Ladina, partindo da afirmação de que o Brasil não é América Latina, são lançados os primeiros elementos para um campo de estudos e pesquisas visando distinguir os significantes que constituiriam a sintomática brasileira. Trata-se de possibilitar uma abordagem capaz de tomar o sintoma tal como é e dizê-lo bem.
Das seções seguintes destacam-se quatro (décima-primeira à décima-quarta), nas quais se aborda de forma original o alcoolismo. Entre outros pontos, percorre-se sobretudo o que a psicanálise já produziu sobre a questão em seus aspectos teórico e clínico; a narrativa bíblica sobre as filhas de Lot, que embebedam o pai para dele engravidarem; os Quatro Discursos, de Lacan; e o texto A Morte e a Morte de Quincas Berro Dágua, de Jorge Amado. A tese é de que se trata da cisão de um Pai Ideal - na dupla face de um obsessivo Pai Bedel em trânsito para um histérico Pai Herói -, a quem o bebedor dá de beber como se, assim fazendo, pudesse passar para o Outro lado (que não há).
Na última seção - Se é que Só é Isso... -, introduz-se o termo Diferocracia, que será desenvolvido no Seminário do ano seguinte.
Potiguara Mendes Silveira Junior
Sumário
1 – 06 Mar: Super-homem, A Mulher
Comentário sobre a Escola de Lacan e sua dissolução – Sintagma Ser-Humano nas ciências – Falo é instância que subverte necessidade e demanda – Esquema de inscrição sexual no animal (relação especular) – Sexuação no falante tem estrutura de espelho.
2 – 20 Mar: Os rouxinóis e as flores
Introdução à questão da sexualidade feminina – Regime do gozo fálico – Apresentação do esquema das fórmulas quânticas da sexuação – Lógica do não-todo.
3 – 10 Abr: Pra não dizer que só falei de flores
Não-relação entre verdade e saber – Regime significante de homem e mulher – Estatuto do gozo feminino – Esclarecimentos sobre “a anatomia é o destino”.
4 – 24 Abr: Menina da rua
Incompatibilidade entre discurso psicanalítico e pedagógico – Dissimetria da castração – Esclarecimentos sobre a fórmula da fantasia ($àa) – Alteridade significante e sujeito – Entendimento da constituição do sujeito a partir do espelho – Sexo do analista.
5 – 15 Mai: Papai dossel
Comparação entre estrutura mínima de parentesco de Lévi-Strauss e estrutura edipiana – Crítica à função antropológica do avunculado – Universalidade da estrutura edipiana não é da ordem do parentesco.
6 – 29 Mai: Tarzan do mau caco
Édipo como teorema fundamental da castração – Para a psicanálise há distinção entre estrutura simbólica e pensamento classificatório – Relação entre impossível e proibido e suas formas de comparecimento.
7 – 12 Jun: Aos cães e aos porcos
Questões sobre iniciação e farsa em psicanálise – O que é a Causa Freudiana e a sustentação da psicanálise.
8 – 26 Jun: Améfrica ladina: introdução a uma abertura
Razões da não participação do Colégio Freudiano do Rio de Janeiro no Congresso de Caracas – Comentário sobre Macunaíma a partir da função paterna – Conceito de zero em Frege e a construção do Nome do Pai – América-Africana como sintoma brasileiro.
9 – 21 Ago: R – Amorteavida
Aspectos simbólicos do Nome do Pai – Comentário sobre O Anti-Édipo, de Deleuze-Guattari – Função do Nome do Pai a partir das fórmulas quânticas da sexuação – Pai Simbólico é única suposição de heterossexualidade.
10 – 04 Set: T-são: A vida, a vida
Binômio Lei/Desejo – Função do Pai Ideal a partir de Estudos sobre o Édipo, de Moustapha Safouan – Inscrição de inibição, sintoma e angústia no nó borromeano – Proposição do Pai Ideal como emergência do Imaginário no Simbólico – Relação entre Pai Simbólico e Amor.
11 – 25 Set: As filhas de Lot
Alcoolismo e as possibilidades de sua clínica – Comentário sobre o texto “Ensaio para uma clínica psicanalítica: o alcóolico”, da Scilicet – Função do Pai Ideal no alcoolismo – Proposição do alcoolismo como requisição histérica.
12 – 09 Out: Bravos eunucos e bacantes frias
Disjunção entre produção e verdade no Discurso da Histérica – Apresentação da engrenagemdos Quatro Discursos – Configurações do Pai Ideal: Pai Bedel e Pai Herói – Questionamento das relações do alcoolismo com a perversão – Histericização da neurose obsessiva caracteriza a estrutura neurótica do alcoolismo.
13 – 23 Out: “Etnologia” do Berro Dágua
Exame da diferença entre ato poético e psicose – Ato poético é dissolução do Nome do Pai em sua função significante – No alcoolismo há clivagem do Pai Ideal em Pai Bedel e Pai Herói – Dois movimentos de atingimento do Outro: Dionísio e Apolo
14 – 06 Nov: O paraisso perdido
Na neurose há inadimplência do Nome do Pai – Comparecimento do Pai Ideal nas formações religiosas e no alcoolismo – Investigação da perversão no alcoolismo – Oscilação entre Pai Bedel e Pai Herói no alcoolismo não promove relação com alteridade.
15 – 27 Nov: Se é que só é isso
Esquema de constituição do sexo anatômico no animal – Esquema de constituição simbólica do ser falante – Esquema comparativo de constituição sexual no homem e no animal – Desejo e só-depois na constituição de homem e mulher – Bissexualidade originária em Freud decorre da impossibilidade da relação sexual – Reconsideração da sexualidade feminina – “O ser falante está condenado à heterossexualidade” – Crítica à homossexualização da cultura – Questão política da sexualidade: diferocracia.
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